quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

O Efeito da Decisão Sobre a Ação Futura

"Numerosos estudos têm sido relatados na literatura psicológica em que lições ou instrução individual são comparadas com a decisão de grupo em termos de sua eficácia na produção de alguma mudança no comportamento. Esses estudos são sumariados por Lewin. Mostram geralmente que, depois de uma decisão de grupo, há mais mudança de comportamento do que depois de uma lição persuasiva.

Embora esses estudos sejam bastante conhecidos, vale a pena recapitular brevemente um deles para mostrar os detalhes do procedimento comumente empregado nesses estudos e para ilustrar os efeitos que estão envolvidos. Num estudo, que fazia parte de um programa de pesquisa sobre a mudança de hábitos alimentares durante a II Guerra Mundial, tentou-se persuadir as donas-de-casa a aumentarem o uso de carnes glandulares. Foram utilizados seis grupos de mulheres no estudo. Em três deles, foi dada uma lição informativa e persuasiva sobre a matéria, acompanhada pela distribuição de receitas. Um estudo de acompanhamento (realizado uma semana depois) determinou que apenas 3% das mulheres desses três grupos tinham acatado a lição e servido carne glandular que jamais haviam comprado antes.
Em vez de uma lição, aproximadamente a mesma informação foi propiciada aos outros três grupos durante uma discussão de grupo sobre o assunto. Além disso, no final da reunião, pediu-se às mulheres que indicassem, levantando as mãos, quem serviria à sua família um dos tipos de carne que nunca haviam servido antes. O estudo de acompanhamento indicou que, desses grupos, 32% das mulheres serviram realmente uma nova carne glandular. A diferença obtida entre as condições é bastante impressionante. Outros estudos, que usaram diferentes tipos de grupos e diferentes espécies de "ação a ser empreendida", apresentaram resultados comparáveis.

Examinemos esses resultados do ponto de vista da teoria da dissonância. Naqueles grupos em que nenhuma decisão foi solicitada, algumas pessoas podem ter sido suficientemente persuadidas pela lição e fizeram o que lhes fora recomendado. No estudo brevemente recapitulado, a ação consistia em servir carnes glandulares e cerca de 3% das mulheres foram persuadidas pela lição a servi-las. Contudo, nos grupos que foram induzidos a tomar uma decisão, pode ter sido criada dissonância por essa decisão. O conhecimento de que elas ou seus maridos não gostariam de carnes glandulares, por exemplo, seria dissonante com a ação que empreenderam ao decidirem servir tal carne. As pressões para reduzir essa dissonância surgiriam então e, na medida em que fossem bem sucedidas em reduzi-la, poder-se-ia esperar que as mulheres se convencessem a si mesmas e umas às outras de que talvez seus maridos gostassem, no fim de contas, de provar esse tipo de carne. Uma vez mudada a cognição dessa maneira, o fato de muitas terem decidido ir em frente e servido realmente carnes glandulares não constitui surpresa. Por outras palavras, o efeito sobre a ação seria uma conseqüência da redução bem sucedida da dissonância pós-decisória.

Embora seja possível explicar os resultados desses estudos de decisão de grupo em termos da redução da dissonância pós-decisória, não podemos esquecer que são possíveis muitas outras explicações. Os estudos sobre decisão de grupo são em grande parte incontroladas, com muitos fatores variando simultaneamente. Por isso não podem ser considerados como fornecedores de boas provas em apoio à teoria da dissonância. A coisa importante a ser sublinhada, entretanto, é que os resultados são compatíveis com as implicações da teoria da dissonância; e o que é mais, se esses resultados são uma conseqüência da redução de dissonância, outras implicações se seguem também. Por exemplo, a teoria da dissonância implicaria que o mesmo tipo de efeito ocorrerá, quer a decisão seja tomada publicamente num grupo ou por um indivíduo isolado, quer se siga a uma discussão ou a uma aula. A questão importante é que uma decisão foi tomada e que dela resultou dissonância, não se houve ou deixou de haver uma discussão de grupo antes da decisão ou se esta foi pública ou particular."

Festinger, L. (1957). Theory of Cognitive Dissonance. Stanford: Stanford
University Press

Nenhum comentário: